quarta-feira, novembro 18, 2009

"As crianças e a Internet" - estudo em Portugal


Estão disponíveis online os resultados da primeira fase do estudo "Crianças e Internet: usos e representações. A família e a escola", incluindo os anexos.
O estudo foi realizado por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, coordenada pela investigadora Ana Nunes de Almeida, e financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian. A primeira fase, já terminada, consistiu num estudo extensivo dos usos e representações, através de um inquérito junto de uma amostra 3039 crianças dos 6 aos 17 anos de todo o país. A segunda, já em curso e com resultados previstos para 2010, continuará a dar voz às crianças, "mas agora também a pais e professores", através de entrevistas compreensivas.

Algumas notas, extraídas das reflexões finais do estudo:
"Os resultados do inquérito ilustram um quase universal acesso ao computador com ligação à internet. Contudo, apesar desta notável inovação que parece atingir largas franjas de população infantil, descobrem-se alguns sinais de diferença no interior da tendência marcante.
Na perspectiva das crianças, e apesar da presença e até por vezes abundância de equipamentos na escola (ex.: nº de computadores, nº computadores ligados à internet, existência de banda larga), os usos da internet no processo de ensino-aprendizagem ficam bem aquém do retrato desenhado pelas estatísticas oficiais ou pelos testemunhos recolhidos junto dos próprios dirigentes dos estabelecimentos de ensino. No campo educativo, as crianças dizem usar pouco a internet na sala de aula, na relação com a escola ou com os professores; muito raramente é introduzida no ensino de disciplinas curriculares que não as TIC ou a Área de Projecto. A internet é utilizada sobretudo como complemento ou enriquecimento de tarefas e de trabalhos escolares que, antes, se faziam sem ela (...)".

"A casa é, assim, um lugar estratégico de aprendizagens – onde a internet constitui não só um recurso educativo, mas também informativo, lúdico e comunicacional. A partir de casa a criança entra no espaço global, exercitando-se como indivíduo activo, decisor e investigador por conta própria, tirando partido e construindo o seu lugar na cultura de pares. Os contactos on-line vêm acrescentar-se, alargar (e não destruir ou empobrecer) as redes de sociabilidade pré-existentes. Diante do ecrã, explorando o mundo virtual, a criança reforça a sua autonomia face aos adultos. É muito expressiva a parcela de inquiridos que afirma ter aprendido a navegar “sozinho”; por outro lado, a esmagadora maioria das crianças declara ser a pessoa que mais a usa a internet em casa, como também se considera auto-suficiente na gestão dos seus canais de comunicação e informação, nas modalidades de descoberta e visita de páginas Web".

"Fora da escola continua a jogar-se muita da aquisição da literacia digital, dos seus usos mais sofisticados, gratificantes e multifacetados; e também a modernidade da condição infantil. Daí o facto de as formas mais persistentes de clivagem digital continuarem a actuar a partir de casa, distinguindo crianças escolarizadas, cujos pais são eles próprios consumidores intensivos destes bens e serviços, utilizadores profissionais e competentes de novas TIC, os quais as iniciam e acompanham no seu uso, das crianças com origens sociais desfavorecidas, residentes em áreas não-urbanas do País, cujos pais mais dificilmente suportam (ou compreendem) a relevância da compra do acesso doméstico à internet (a que se somarão as deficiências de cobertura dos serviços de acesso à internet por parte dos diversos operadores comerciais). E daí a urgência de a escola repensar o lugar e o estatuto da internet no sistema de ensino-aprendizagem, de modo a proporcionar a todas as crianças, no espaço escolar, os seus diversificados níveis de domínio. Como recorrentemente se afirma na literatura e os resultados deste trabalho parecem confirmar para o contexto escolar: “The locus of inequality is shifting
from technology access (haves and have-nots) to quality use (as assessed by time use, skills and range of on-line activities)” (Livingstone et. al: 2005)."

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