A propósito do meu post anterior "O nome e a coisa", podemos ir um pouco mais longe na reflexão, deixando (apenas aparentemente) de lado as questões de nomenclaturas e indo mais à substância do assunto. Recorro à ajuda de um livrinho de Dominique Wolton, de 2009, intitulado « Informer n’est pas communiquer » (Paris : CNRS Éditions).
A pp. 23-24, este sociólogo francês propõe o sumário daquilo que chama uma “aparentemente modesta” teoria da comunicação que resume nas cinco etapas seguintes:
“Primeiro. A comunicação é inerente á condição humana. Não há vida pessoal e colectiva sem vontade de falar, comunicar e intercambiar, tanto à escala individual como colectiva. Viver é comunicar.
Segundo. Os seres humanos desejam comunicar por três razões: partilhar, convencer e seduzir. E frequentemente pelas três razões ao mesmo tempo, mesmo que isso não seja reivindicado.
Terceiro. A comunicação leva à incomunicação. O receptor nem sempre está em sintonia ou não está de acordo.
Quarto. Abre-se uma fase de negociação em que os protagonistas, mais ou menos livre e igualitariamente, negociam para encontrar um ponto de acordo.
Quinto. O resultado, se positivo, chama-se coabitação, com as suas forças e as suas debilidades. A negociação e a coabitação constituem um procedimento para evitar a incomunicação e respectivas consequências, frequentemente belicosas".
Wolton considera que, pelo menos nos dois séculos passados, informação e comunicação eram como que sinónimo e constituíam-se como parceiras da batalha pela liberdade de expressão, da liberdade política e dos direitos humanos. A performatividade técnica permitiu a proliferação de mensagens e a sobreposição da informação à comunicação. Mais: foi fazendo caminho a ideia de que existe uma relação de continuidade entre informação e comunicação e que a informação leva (como que automaticamente) à comunicação, quando os riscos da incomunicação são, paradoxalmente, cada vez mais fortes. O que leva o nosso autor a defender a ideia de que os riscos dos mal-entendidos e dos contenciosos, tanto no plano das relações inter-individuais e grupais, como interculturais e globais fazem da aposta na comunicação como uma das questões “da paz ou da guerra”, no século XXI. O que se conseguirá pela aprendizagem dos procedimentos que podem apontar e favorecer a comunicação: negociar e coabitar, conceitos-chave da sua teoria.
Wolton explicita melhor a sua ideia neste passo:
“ Esta incomunicação estrutural necessita evidentemente da igualdade de protagonistas, sob pena de não haver negociação, o que faz da comunicação dos nossos dias uma realidade indissociável da cultura democrática e um processo bastante mais amplo do que a simples expressão. Não existe, portanto, comunicação sem um mínimo de tempo, de respeito e de confiança mútua, fazendo da tolerância uma das condições estruturais de qualquer processo de comunicação”.
Poderia parecer, deste posicionamento, que a informação seria, afinal, instrumental à comunicação. Não é por aí que vai Wolton. Ele entende que não é correcto hierarquizar mensagem e relação, informação e comunicação. Importa, isso sim, pensá-las conjuntamente e relacionalmente. O desfio está aqui: a vitória da informação, na modernidade, obriga-nos a repensar o estatuto da comunicação.
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