Faz falta um serviço
público de televisão, mesmo, e talvez sobretudo, em tempos de crise. Não necessariamente
nos moldes em que existe – entendo que, sobre isso, há opções a tomar. Quando o
dinheiro é escasso, costuma dizer-se: que vão os anéis, mas fiquem os dedos.
Mas, neste caso, o que são os anéis e o que são os dedos? Se “nem só de pão vive
o Homem” (Mt 4,4), pode-se morrer também da falta daquilo que está para além do
pão: temos uma necessidade vital de cultura, de criatividade, de pensamento
crítico, de alargamento de horizontes, de espiritualidade. Sem isso não se vive
e a sociedade definha.
Considero inconsistente a
ideia de que os canais privados, podem perfeitamente fazer – e de forma mais
barata – aquilo que um operador público faz. A prática, aqui como lá fora, mostra
que não é assim e não são casos isolados ou pontuais – de um documentário, de
um filme, de uma reportagem – que justificam o argumento.
Sou dos que acham que a
informação deve ter um lugar proeminente em qualquer projecto de serviço público,
proporcionando visibilidade às diversidades geográfica e temática nacionais e
globais, incluindo dos grupos e minorias, e contribuindo, através das notícias
e do debate, para uma compreensão crítica do mundo e uma clarificação do lugar
e papel e de cada um nele. Mas não sigo, de todo, os que desqualificam
culturalmente o papel do entretenimento e do espectáculo, que, além de
intrínseco ao meio televisivo, tem um lugar incontornável na sociedade e na
cultura. O problema não é se sim ou não, mas o modo como se faz. E aí é
exigível que o serviço público seja inovador, experimental e criativo. Seja, em
suma, diferente.
Há dois grupos que merecem
cuidado especial, num projecto televisivo de serviço público: os mais pequenos
e os mais velhos. Dos canais privados podemos esperar séries cheias de aventura
e de suspense para as crianças e
programas que entretenham e confortem os seniores. Mas não lhes será exigível
que assumam um carácter formativo e que ampliem horizontes culturais, cívicos e
políticos.
Aquilo que, finalmente,
distingue um serviço público de TV é a capacidade de ajudar a ler criticamente
os próprios media, através de conteúdos orientados para a literacia mediática e
informativa e dos programas dos provedores.
Isso é exigido hoje no plano europeu, mas carece ainda de muito maior
investimento.
(Texto publicado na edição de 19.9.2011 do diário digital Página 1)
3 comentários:
Estou de acordo Manuel Pinto. A frase "mas não lhe será exigível" é que não percebo. Está mal formulada ou é gralha?
Obrigado pelo comentário, José Carlos.
O que quero dizer (admito que pode não estar claro) é que aquilo que se espera dos privados não é exactamente o que se exige ou deve exigir do serviço público. Nomeadamente no que se refere à programação para os mais novos e para os séniores.
O problema da RTP, mais especificamente a RTP1, é que está dirigido a um público idoso, pouco exigente e que trata a TV como a "lareira" à volta da qual passa os dias.
Não é que isso só por si seja mau, a questão é que leva os restantes a sintonizar outros canais (cada vez o cabo).
Continuo é sem perceber o que é feito do teatro e do cinema Português em prime-time na RTP1. E também não percebo como é que um Serviço Público que tem obrigação estatutária de inovação tecnológica é o último da Europa a adoptar o HD e o 16:9 e ninguém fala no assunto.
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